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Ação civil pública pelas comunidades de periferia

O Instituo Igentes, junto com a Associação dos Moradores do Frei Damião, entrou com uma Ação Civil Pública contra o município de Palhoça, o Estado de Santa Catarina e a União Federal exigindo ação imediata em defesa da vida dos mais de doze mil moradores da região do bairro Frei Damião. Esse bairro, que é um dos maiores do município, ocupa uma área em torno de 30 mil metros quadrados. Ele foi formado a partir de uma ocupação iniciada ainda na década de 1980. E, apesar de estar localizado bem ao lado do bairro Pedra Branca, próximo a Unisul, o contrataste entre os dois é gigante.

É possível perceber que enquanto os investimentos da prefeitura são massivos no bairro nobre perto da universidade, de alta classe, o Frei Damião está completamente abandonado, provavelmente por ser uma das comunidades mais empobrecidas de Santa Catarina. Lá, não há fornecimento regular de água, muito menos de energia elétrica. Conforme o Igentes, a maioria das ruas não tem pavimentação, e o esgoto corre a céu aberto, pelas ruas ou valas improvisadas e há casas que sequer possuem banheiro ou vaso sanitário. Também existem diversas famílias que vivem em coabitação, ou seja, várias famílias morando no mesmo barraco, amontoados em pequenos cômodos, espaço seguro para proliferação de um vírus como o da Covid-19.

Conforme um levantamento feito pelo Sebrae em 2013, o bairro possuía 1.346 casas e barracos, todos irregulares, sendo que a maioria dos moradores tinha renda de 1/3 do salário mínimo.  Hoje, conforme a Associação de Moradores, já são mais de 12 mil pessoas vivendo no Frei Damião, sendo que 1.612 são crianças de zero a 12 anos. Pelo menos 943 destas famílias dependem de cestas básicas, que agora durante a pandemia estão sendo distribuídas de forma solidária e voluntária por movimentos sociais, visto que o município não tem qualquer ação para o bairro. Além disso, estão registradas 197 grávidas, 250 idosos, doentes graves com HIV, lactantes e deficientes físicos.

Não bastasse a situação da comunidade Frei Damião ainda existe a região da Beira Rio, também em Palhoça, próxima ao bairro, com mais  114 famílias, 132 crianças, 13 idosos, 206 adultos, 2 grávidas, 19 doentes, 4 deficientes, 4 casas sem banheiro, totalizando 351 pessoas, também vivendo em barracos sem estrutura alguma. Essas também são famílias que não têm condições de se defender diante da pandemia do coronavírus, daí a ação responsabilizando o Estado.

Com base na Constituição federal que determina o direito à vida, à moradia digna, saúde e educação, a ação civil busca garantir que essas famílias possam ser protegidas nesse momento de emergência sanitária que vive o país, afinal, além do número alto de pessoas doentes, a situação de pobreza gera desnutrição piorando ainda mais as condições de imunidade. Sem água encanada, por exemplo, como esses milhares de trabalhadores podem manter as condições de higiene que evitam a disseminação do vírus?

A ação civil aponta a responsabilidade do estado de Santa Catarina com essas pessoas que precisam ter seus direitos assegurados. Como a maioria dos moradores não tem trabalho formal, a situação é de desespero. Falta comida, falta saneamento e  falta cuidado.

Sendo assim, visando proteger a vida da comunidade , a ação requer as seguintes ações:

  1. Que o Município de Palhoça, o Estado de Santa Catarina e a União, em até 5 dias, após sua citação, adotem medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo coronavírus – Covid-19, no bairro Frei Damião e Beira Rio, Palhoça/SC, com a redução dos fatores de propagação do vírus, implementando medidas sanitárias,
  2. Construção de banheiros nas casas em que não há;
  3. Disponibilização de água nas residências que não possuem água encanada;
  4. Fornecimento de máscaras, álcool gel e sabão para todas as pessoas e residências;
  5. Plano de saneamento para todo o bairro do Frei Damião e Beira Rio, solucionando o esgoto a céu aberto.
  6. Que o Município de Palhoça, o Estado de Santa Catarina e a União apresentem plano de ação, em relação ao bairro Frei Damião e Beira Rio, em até 5 dias, após sua citação, que garanta:
  7. Medidas de isolamento na forma dos protocolos das autoridades sanitárias;
  8. Realização de campanha informativa acerca da Covid-19;
  9. Levantamento de pessoas com Covid-19 ou com suspeitas, na comunidade Frei Damião e Beira Rio;
  10. Levantamento de leitos em internação e em UTI que possa atender a Comunidade do Frei Damião e Beira Rio;
  11. Transporte dos doentes e grávidas da comunidade Frei Damião e Beira Rio nas consultas, exames e internação, bem como fornecimento de remédios aos doentes crônicos, com Covid-19 ou doenças respiratórias;
  12. Garantia de testes aos suspeitos da Covid-19; g. Designação de equipe médica, específica para a comunidade do Frei Damião e Beira Rio, com local de atendimento e visitas domiciliares, quando necessário;
  13. Designação de equipe de assistência social para a comunidade do Frei Damião e Beira Rio, garantindo o fornecimento de cestas básicas para as famílias que necessitam;
  14. Providenciar quartos de hotel, alojamento ou casa com alimentação e higiene, para as pessoas dos bairros Frei Damião e Beira Rio, que, segundo critério das autoridades sanitárias, necessitarem se ausentar de casa para ficar em quarentena visando evitar o contágio da Covid-19, em condições dignas e em local próximo aos seus familiares;
  15. Instalação de rede de internet, com acesso livre wi-fi, de forma gratuita, com abrangência em todo o bairro Frei Damião e Beira Rio, para que a comunidade possa ter acesso às informações acerca da Covid-19, bem como para que os alunos possam acessar as aulas online, garantindo o direito à educação;
  16. Instalação de salas com computadores, para acesso público, para quem não tem celular/computador, para que a comunidade possa ter acesso às informações acerca do Covid-19, bem como para que os alunos possam acessar as aulas online, garantindo o direito à saúde e educação, garantido o devido distanciamento e medidas de higiene na forma dos protocolos sanitários.

Segundo a advogada Celina Rinaldi, do Instituto Igentes, essa ação será usada como exemplo para outras ações do mesmo tipo envolvendo outras comunidades de periferia que passam pela mesma situação de descaso no estado. Ouça a entrevista: